Era o camarada mais
porreta do lugar. Não havia em seu coração lugar para tristezas. Nunca o víamos
chateado ou irritado com alguma coisa. Pau para toda obra, um pé-de-boi, como
se costuma dizer de quem está sempre pronto para o trabalho. Às quatro horas da
manhã lá estava ele cantando e fazendo pilhérias na feira-livre. Querido por
todos, ganhava o seu trocado como carregador e no auxílio aos feirantes. Esse
era João Gostoso, sorriso largo e amigo de todas as horas.
Porém, num belo dia, se é
que se pode chamar de belo um dia como aquele. João chegou taciturno, não
cantou, não sorriu. Ninguém entendeu nada do que estava acontecendo. Ficou
assim a manhã toda. Do jeito que chegou, saiu. A feira sem a alegria de João
não foi a mesma, sua voz não encantou, aliás, ele nem cantou. A dúvida pairava
no ar, o que teria acontecido? Que bicho o havia mordido? Por que estava assim?
À noite como de costume
foi até o bar Vinte de Novembro, não bebeu, não cantou e também não dançou.
Será que João havia se cansado? As cabrochas não receberam o galanteio
habitual, o garçom a desculpa de sempre na hora de pagar a conta. Aquela noite
o bar não sorriu. João na multidão sumiu.
Extra! Extra! Encontraram
o mais novo milionário da mega-sena. Essa era a noticia do dia. Quem seria esse
sortudo? Era discussão do momento. O que fazer com tanto dinheiro? Essa era a
preocupação de João. Havia aprendido viver com pouco, e disso fez sua alegria e
razão para viver. Fez amigos, viveu amores. E agora como viver?
Assim terminou a madrugada
daquela noite, sim terminou na madrugada, pois o restante da noticia estava
estampada assim: “Encontraram o mais novo milionário da mega-sena morto afogado
na Lagoa Rodrigo de Freitas, conhecido como João Gostoso”.
Crônica elaborada a partir
da leitura do poema de Manuel Bandeira “Noticia de Jornal”.
José
Geraldo da Silva
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