terça-feira, 2 de outubro de 2012

CHEGOU A HORA DE LER AUGUSTO MATRAGA



 

Dentre os gêneros literários que mais me agradam está o conto e nesta galeria de leituras realizadas destaco a obra de João Guimarães Rosa “Sagarana”, principalmente o conto “A hora e vez de Augusto Matraga”. Ler este conto é estar sempre pronto para o novo, é sempre surpreendente. Acredita-se que Rosa se completa nesta obra. E a história, ou como queiram estória de um homem devasso chamado Augusto Esteves, que após ser dado como morto ressurge e passa ter uma vida resignada e de penitências em decorrência de seu passado, que tem como objetivo ir para o céu nem que seja a porrete. O seu lema é minha hora há de chegar. Vive com um casal de negros que o socorreram e cuidaram de seu restabelecimento. É tentado, porém resiste e cumpre a sua sina, numa sexta feira da paixão.
Este texto pode ser lido e estudado das mais diversas formas. Do ponto da estilística sobram elementos. A combinação de sons criada na narrativa é impressionante. Aliás, é um texto para ser lido em voz alta, dá se a impressão de estarmos numa procissão em que são cantadas ladainhas, pois em todo tempo são apresentados ditados populares que mais se parecem com preces de penitentes e em meio à narrativa são cantadas cantigas folclóricas. É impressionante o ritmo causado pela composição e escolha lexical. É como se estivéssemos numa conversa bem típica de mineiros.
Outra marca importante deste conto é o elemento místico, a presença do sincretismo religioso é constante. Pode-se observar isso nos termos usados pelo narrador, como por exemplo: o preto e a preta, uma alusão aos pretos velhos da umbanda, os curandeiros e mandingueiros, a presença do padre representante do catolicismo.  O próprio nome Augusto pode ser uma referência à Santo Agostinho, que antes de se converter era um homem desregrado, mas que se converteu ao cristianismo e viveu resignadamente. E por fim, a referência a Cristo quando ele monta num burrinho para seguir o seu destino.
Continuando na linha do místico, o encerramento do conto não deixa nenhuma dúvida quanto aos elementos religiosos apresentados. O clímax é marcado por um momento de tensão, em que o bem luta contra o mal, algo presente na religiosidade do povo, a eterna luta bem versus mal. É a força do mal sendo enfrentada pela força do bem. A atitude de Augusto de se colocar na frente do jovem marcado para morrer e duelar contra o famoso chefe de jagunços Joaozinho Bem-Bem, é sem dúvida o marco decisivo para a sacramentação do místico na obra, é a referência maior sobre a obra redentora de Cristo, aquele que deu a sua vida pela humanidade. Sem esquecer que Cristo morreu numa sexta feira, como Augusto.
A leitura deste conto é uma aventura rumo ao desconhecido, com inúmeras surpresas pelo caminho, tanto linguístico, como estilístico. Mas não é só isso que esta obra oferece. Ela é recheada de reflexões sobre a vida, os homens, o mundo. O sagrado e o profano se misturam para nos fazer pensar sobre nossas atitudes. Augusto é a expressão máxima do humano. Suas idiossincrasias são semelhantes às nossas. Optar pelo certo ou errado é uma questão de ponto de vista. A procissão que acompanha todo o conto é a máxima da leitura do homem e seus conflitos.
Enfim, é um texto sublime. Poderia apresentar mais sobre esta leitura fascinante, mas daí viraria um artigo, deixo para vocês o desafio de realizar a leitura, para então termos um dedinho de proza, porque esta é uma história inventada e Matraga não é Matraga, não é nada.

                                                                                        José Geraldo da Silva

Nenhum comentário:

Postar um comentário